O doente e/ou o representante legal devem ser informados e esclarecidos da necessidade do plano terapêutico da fibrose quística (FQ), dos efeitos secundários, benefícios e riscos da terapêutica.
Deve ser disponibilizado folheto informativo sobre o plano terapêutico da fibrose quística (FQ) ao doente, representante legal e/ou cuidador.
A monitorização da adesão e da eficácia terapêutica devem ser avaliadas periodicamente através da marcação de consulta (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa).
Em todos os doentes deve ser avaliado o cumprimento do Programa Nacional de Vacinação (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação I).
Em todos os doentes com FQ, para além do Programa Nacional de Vacinação deve ainda ser prescrito o seguinte esquema de vacinação complementar (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa):
- Vacina antivaricela;
- Imunoglobulina antivaricela em doentes graves, se em contacto com doença e sem história prévia de varicela ou se sob corticoterapia sistémica;
- Vacina antigripal anual a partir dos 6 meses, em doentes e conviventes;
- Vacina antipneumocócica conjugada 13-valente (doentes ≤ 2 anos e >2 anos) seguida de polissacárida 23-valente (doentes > 2 anos) se serologia negativa para Pneumococcus;
- Vacina anti-hepatite A.
Em todos os doentes com FQ deve ser assegurada a adequada drenagem das secreções brônquicas recorrendo a: (algoritmos 1-5 e Anexo I, Quadros 1-7):
- Cinesiterapia respiratória que deve ser iniciada em todos os doentes imediatamente após confirmação do diagnóstico e mantida ao longo da vida, quer na fase de estabilidade clínica quer nas exacerbações (Anexo I, Quadro 7) (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação I);
- Em doentes com idade ≥ 6 anos deve ser associado à cinesiterapia:
- Dornase alfa recombinante (Anexo I, Quadro 6), qualquer que seja a gravidade, incluindo nas exacerbações (a administrar, através de um sistema de nebulização indicado para a sua administração) (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação I); e/ou
- Soro salino hipertónico em nebulização, prescrito em associação ou como alternativa à dornase alfa recombinante em situações de intolerância ou ausência de resposta (Nível de Evidência B, Grau de Recomendação IIa);
- N-acetilcisteína por via oral:
- Em substituição da dornase alfa recombinante e/ou do soro hipertónico em doentes com hemoptises moderadas a graves;
- Em associação com a dornase alfa recombinante e/ou o soro hipertónico m doentes com grave compromisso funcional e dificuldade em drenar secreções muito espessas (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa).
Nos doentes com FQ o tratamento da infeção respiratória deve ser prescrito de acordo com o microrganismo isolado e as características e gravidade do quadro clínico:
- Na infeção respiratória por Haemophilus influenzae deve ser prescrito (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa):
- Amoxicilina + ácido clavulânico durante 2 semanas quer se trate de uma tentativa de erradicação num primeiro isolamento, quer se trate de uma exacerbação; ii. A opção pela prescrição da terapêutica antibiótica via oral ou via endovenosa deve ser feita tendo em conta a gravidade;
- Não há indicação para terapêutica supressora crónica.
- Na infeção respiratória por Staphylococcus aureus sensível à meticilina deve ser prescrito:
- Profilaxia da infeção a Staphylococcus aureus sensível à meticilina com flucloxacilina permanente a todos os doentes com idade inferior a 3 anos (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação II);
- Tratamento do primeiro isolamento de Staphylococcus aureus sensível à meticilina;
- Flucloxacilina durante 4 semanas; ou
- Associação de dois antibióticos (flucoxacilina + macrólido ou rifampicina); ou
- Ácido fusídico durante 3 semanas.
- Deve-se repetir este esquema nas exacerbações (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação II);
- A terapêutica supressora crónica com flucloxacilina permanente está indicada a todos os doentes com colonização crónica por Staphylococcus aureus sensível à meticilina com idade inferior a 3 anos e aos doentes que acima desta idade apresentam deterioração funcional respiratória (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação II);
- Na infeção respiratória por Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA) deve ser prescrito:
- Tratamento do primeiro isolamento de MRSA:
- Associação de 2 antibióticos por via oral (rifampicina + ácido fusídico) durante 3 semanas (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa):
- Na ausência de eficácia do tratamento do primeiro isolamento de MRSA devem ser consideradas duas opções terapêuticas:
- Rifampicina + ácido fusídico via oral durante 3 semanas; ou
- Linezolido via oral durante 3 semanas (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa);
- No tratamento das exacerbações nos doentes cronicamente colonizados com MRSA deve ser prescrito:
- Rifampicina + ácido fusídico via oral durante 3 semanas; ou
- Linezolido via oral durante 3 semanas;
- Vancomicina, teicoplamina ou linezolido via endovenosa (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa);
- O tratamento da infeção respiratória por Pseudomonas aeruginosa pressupõe a consideração das seguintes fases (colonização inicial, intermitente, crónica e exacerbação) a que correspondem estratégias terapêuticas diferentes (terapêutica de erradicação, terapêutica supressora crónica e terapêutica de exacerbação) (algoritmos 2 a 4 e Quadros B, C e 4) (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação IIa):
- Na fase de colonização inicial deve ser indicada a terapêutica de erradicação:
- Um antibiótico anti Pseudomonas via inalatória por um período até 12 meses associado a um antibiótico anti Pseudomonas via oral durante 3 semanas (ciprofloxacina); ou
- Apenas um antibiótico anti Pseudomonas via inalatória, de acordo com a avaliação clínica, por um período até 12 meses em ciclos on-off:
- Em caso de insucesso deve ser repetido o mesmo esquema:
a. Um antibiótico anti Pseudomonas via inalatória por um período até 12 meses associado a ciprofloxacina via oral durante 3 semanas (antibiótico anti Pseudomonas); ou
b. Apenas um antibiótico anti Pseudomonas via inalatória, de acordo com a avaliação clínica, por um período até 12 meses em ciclos on-off, ou
c. Associação de um aminoglicosido com carbapenemo ou beta lactâmico anti Pseudomonas via endovenosa durante um período até 12 meses (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação I);
- Na fase de colonização crónica, deve ser indicada a terapêutica supressora crónica:
- Um antibiótico anti Pseudomonas, a colistina via inalatória (a administrar de forma contínua recorrendo aos sistemas de administração que foram validados para o seu uso) (Algoritmos 2 a 4 e Quadros B e 5) (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação IIa);
- Dois antibióticos anti Pseudomonas (colistina, tobramicina, aztreonam) via inalatória (a administrar alternadamente mas de uma forma contínua, recorrendo aos sistemas de administração que foram validados para o seu uso) (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa).
- O reconhecimento da eficácia terapêutica deve basear-se no controlo da deterioração funcional e na redução do número de exacerbações e não na negativação dos exames microbiológicos (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação IIa):
- Na fase de exacerbação, deve ser indicada a terapêutica da exacerbação:
a. Ciprofloxacina via oral durante 3 semanas associada a um antibiótico anti Pseudomonas via inalatória (Algoritmos 2 a 4 e Quadros C e 5); ou
b. Associação de aminoglicosido com carbapenemo ou beta-lactâmico antiPseudomonas via endovenosa, por um período mínimo de 2 semanas;
c. Nas situações de multirresistência, como opção terapêutica, a colistina via endovenosa durante um período mínimo de 2 semanas (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação I).
- Na infeção respiratória por agentes do Complexo Burkholderia cepacia deve ser prescrito (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa):
- Tratamento do primeiro isolamento segundo antibiograma com associação de, pelo menos, 2 antibióticos via endovenosa por um período não inferior a 3 semanas:
- Tratamento das exacerbações com o mesmo esquema terapêutico (segundo antibiograma com associação de, pelo menos, 2 antibióticos via endovenosa por um período não inferior a 3 semanas).
- O tratamento da infeção respiratória a Stenotrophomonas maltophilia e Achromobacter xylosoxidans não sendo suportado pela evidência deve ser baseado na avaliação clínica, particularmente, em situações de exacerbação em que se excluam outros agentes responsáveis e segundo antibiograma, durante um período mínimo de 2 semanas (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa);
- Na infeção respiratória por Fungos, incluindo Aspergillus spp deve ser prescrito:
1. Corticoterapia sistémica como terapêutica inicial da Aspergilose broncopulmonar alérgica (ABPA) (Nível de Evidência B, Grau de Recomendação IIa);
2. Na ABPA que não responda à corticoterapia e nalguns casos selecionados de colonização crónica por A. fumigatus, na ausência de critérios imunológicos de sensibilização e após exclusão de outras causas de deterioração e otimização da restante terapêutica, deve prescrever-se terapêutica antifúngica por um período de 3 a 6 meses (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa);
3. Nos doentes com FQ e aspergilose invasiva ou semi-invasiva devem ser ser prescritos antifúngicos via endovenosa durante um período de 2 semanas;
4. Na infeção respiratória por micobactérias atípicas deve ser prescrito :
a. Uma associação de antibióticos por tempo prolongado (12 meses pós negativação) em doentes com:
- Isolamentos sucessivos da mesma micobactéria na expetoração associados a:
- Evidência de deterioração clínica e funcional que não responda à terapêutica antibiótica para outro agente colonizante identificado; e/ou
- Tomografia computorizada (TC) de alta resolução (imagens nodulares periféricas ou lesões cavitadas) (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa).
Nos doentes com FQ para a imunomodulação da resposta inflamatória deve ser prescrita azitromicina via oral por período prolongado, sobretudo nos casos de colonização crónica por Pseudomonas aeruginosa (algoritmo 2) (Nível de Evidência B, Grau de Recomendação IIa);
Nos doentes com FQ a terapêutica broncodilatadora deve ser efetuada recorrendo a:
- Profilaxia do broncospasmo:
- Broncodilatadores inalatórios de curta duração de ação (ß-2 agonistas de curta ação) a anteceder a cinesiterapia respiratória e a administração de fármacos inalados (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação I).
- Tratamento do broncospasmo:
- Broncodilatadores via inalatória de longa duração de ação (ß2 agonistas de longa ação), como primeira opção terapêutica (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação I);
- Corticoterapia via inalatória nos doentes que mantém broncospasmo sob terapêutica broncodilatadora regular, principalmente na presença de atopia (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa);
- Associação de metilxantinas (teofilina ou aminofilina), como terapêutica de segunda linha quando há insuficiente resposta aos broncodilatadores de primeira linha (ß2 agonistas de longa ação) (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa). c) Corticoterapia sistémica em casos de broncospasmo grave ou exacerbação, apenas o tempo necessário para controlo sintomático (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa);
Nos doentes com FQ a prescrição de oxigenoterapia de longa duração deve ser efetuada de acordo com a Norma N.º 018/2011 “ Cuidados Respiratórios Domiciliários: Prescrição de Oxigenoterapia” nas seguintes situações:
- PaO≤55 mmHg (Nível de Evidência B, Grau de Recomendação I);
- PaO2 entre 55-60 mmHg, na presença de cor pulmonale crónico ou hipertensão pulmonar e/ou poliglobulia (hematócrito >55% (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação I).
Nos doentes com FQ a ventilação não invasiva deve ser indicada nas situações de insuficiência respiratória global, quer seja ou não, no contexto de exacerbação (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa).
Os doentes com FQ em estádio avançado em que não se verifica resposta a todas as alternativas terapêuticas disponíveis devem ter indicação para transplante pulmonar bilateral (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação I).
Os doentes com FQ e indicação para transplante pulmonar bilateral devem ser acompanhados em estreita colaboração com os centros de transplante.
Nos doentes com FQ e insuficiência pancreática exócrina (IPE) devem ser prescritos enzimas pancreáticos sob a forma de formulações resistentes ao pH ácido e à ação proteolítica do suco gástrico, associados a suplementação com vitaminas lipossolúveis (algoritmo 6) (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação I).
Nos doentes com FQ e diabetes (algoritmo 6) deve ser prescrita insulina (consultar Norma N.º 025/2011 “Insulinoterapia na Diabetes Mellitus Tipo 2” (Nível de Evidência B, Grau de Recomendação IIa).
Nos doentes com FQ e doença hepática deve ser prescrito ácido ursodesoxicólico (algoritmo 7) (Nível de Evidência C, Grau de Recomendação IIa ).
Os doentes com Fq e falência hepática grave devem ter indicação para transplante hepático (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação I).
Os doentes com FQ e indicação para transplante hepático devem ser acompanhados em estreita colaboração com os centros de transplante.
No tratamento do refluxo gastroesofágico (DRGE) associado à FQ devem ser prescritos inibidores da bomba de protões (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação I).
No tratamento do síndrome de obstrução intestinal distal (SOID) associado à FQ devem ser prescritos laxantes osmóticos contendo polietilenoglicol (PEG), de preferência em solução isosmótica, ou, em alternativa, gastrografina via oral (Nível de Evidência B, Grau de Recomendação IIa).
No tratamento da doença óssea associada à FQ está indicada a suplementação com vitamina D e cálcio e de acordo com a avaliação clínica, a terapêutica com bifosfonatos (ver Anexo II, Quadro 8) (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação I).
No suporte nutricional em doentes de risco devem ser indicados, de acordo com a avaliação clínica (Anexo I, Quadro 9) (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação IIa):
- Suplementos dietéticos; e/ou
- Nutrição entérica noturna ou contínua com fórmulas poliméricas hipercalóricas; e/ou
- Nutrição parentérica.
Deve ser prescrito a todos os doentes com FQ a prática exercício físico adequado à gravidade da sua situação clínica, como parte integrante do programa de reabilitação (Nível de evidência C, Grau de Recomendação IIa).
Qualquer exceção à Norma deve ser fundamentada clinicamente, com registo no processo clínico.
Algoritmos clínicos (ver pdf).
O instrumento de auditoria clínica (ver pdf).
A presente Norma, atualizada com os contributos científicos recebidos durante a discussão pública, revoga a versão de 28/12/2012, atualizada a 10/01/2014 e será de novo atualizada sempre que a evolução da evidência científica assim o determine.
O texto de apoio seguinte orienta e fundamenta a implementação da presente Norma.